Thursday, December 04, 2014

Dia 99 - 13 Novembro - Peganhosa

Ainda deitada sinto o calor a colar-me aos lençóis.
A Nora hoje está rouca. Diz que está constipada. Espero que fique melhor depressa mas esta mudança de tempo tão repentina nunca é coisa boa. Já todos tinham saído de casa quando me levantei. Ao sair de casa estava, à porta, o rastafari. Já há algum tempo que o cumprimento sempre com um handshake assim


- Bom dia, sister! - diz-me ele sempre com um grande sorriso. Nunca o vi com má cara. Tem sempre um sorriso iluminador que brilha no rosto! É um ser puro, respeitador, simpático e, extremamente, bom! "Bom" parece ser uma palavra tão curta e tão pequenina, mas o seu significado é simples e bem grande. Gosto muito de o ver todos os dias e, quando não está lá, faz falta!

Hoje fiquei sozinha a gerir o espaço. Não é difícil, mas é uma grande responsabilidade. Por outro lado, é bom saber que confiam em mim para o permitirem. Não posso desiludi-los! Conto com todo o pessoal para me ajudar no que for necessário e para fazerem as suas tarefas impecavelmente! Não me sinto acima de ninguém e, por isso, elogio e agradeço sempre, seja no trabalho, no dia-a-dia, no que for. O pessoal é impecável comigo e tenho-me dado muito bem com todos.
Ainda sou verdinha e falham-me termos, expressões ou, até mesmo, as coisas que escrevem à pressa. Tenho de perguntar uma, duas e três vezes até perceber e, todos os colegas, sem excepção, têm sido muito pacientes comigo. Hoje, por exemplo, aconteceram umas engraçadas.
- Priciso di dinhêro, sff.
- Para quê?
- Para fazer compras.
- Isso sei eu - disse eu com um sorriso - mas para comprar o quê? É porque tenho de justificar a saída do dinheiro - sorriu.
- Para comprar uma mópi.
- ???? Uma quê?!
- Uma mópi!
- O que é isso? - nesta altura sinto-me um bicho raro de escassa esperteza... não por não saber, mas pelos olhares de espanto que me são direccionados!
- Serve para lavar o chão
- Ok, toma lá, então. Voltou com uma esfregona. Já aprendi alguma coisa hoje. Mas a coisa não se ficou por aqui. Mais tarde veio outro rapaz:
- Priciso di dinhêro, sff.
- Para quê?
- Para comprar ráma - depois do que se tinha passado anteriormente achei melhor ficar de bico calado e aguardar, ansiosamente, pelo recibo.
... Mas no recibo vinha descrito o que ele comprou: "rama"! Só quando cheguei a casa consegui deslindar o mistério... é margarina! Alguém me sabe explicar porquê o nome?! É que mópi ainda vem do inglês - mop - agora rama não estou a ver.
Já pouco antes de sair um dos empregados de mesa, naquela agitação stressante que é atender a todos os pedidos o mais rápido possível, gritou-me:
- Sai uma einiquen! - ao que, na minha cabeça, pontos de interrogação começaram a zanzar.
- Sai uma quê?! - ele mostrou a garrafa e repetiu


- Uma einiquen!
- Ah, é Heineken!
- É einiquen. Heineken é em inglês, einiquen é em Moçambicano!


... é que nem é em inglês!

O calor é tema de conversa o dia todo. Está muita humidade e a temperatura sobe aos 42º! Está insuportável! Ponho a mão na cara e a palma cola ao rosto quando a puxo! Há clientes a perguntar pelo lugar mais fresco, ao que respondo «perto da ventoinha ou em qualquer lugar com uma bebida bem fresca»! E ainda dizem que o verdadeiro calor ainda não chegou... sinto-me "peganhosa"! Um misto de "peganhenta" com gordurosa! cada vez me sinto mais a "bruxa má do oeste"! Por entre conversas ouve-se falar em chuva e trovoada ainda hoje. O normal é pensar que, se chover, vai refrescar. Mas não! Aqui é ao contrário, depois de chover volta o calor ainda mais intenso! E a coisa torna-se num "pau de dois bicos"!

Hoje vi, finalmente, um lagarto azulão! Aquele devia ter uns 30cm de comprimento. Vi-o à distância, mas era lindo. Rapidamente trepou a árvore e desapareceu. Vi ainda uma pequena lagartixa com uns 5cm, se tanto, de comprimento. Tão querida. Pequenina e muito fofa. Se não se mexesse tão rápido era capaz de tentar fazer amizade... Só tenho pena de não ter, ainda, uma máquina fotográfica de jeito porque havia de tirar umas fotografias lindíssimas a tantos seres vivos! Plantas e animais!

Só quando chegou a Cal é que eu já ficava descansada para sair. A Cal é a prima afastada que conheci cá. Damo-nos muito bem. Gosto muito dela! Foi sempre impecável comigo, antes e depois de começar a trabalhar ali. E formamos uma dupla impecável ali a trabalhar! Embora estivesse cansada e quisesse vir para casa, também me apetecia ficar ali com ela e no ambiente que ali se proporciona.
Como já saí de noite tinha de arranjar quem me trouxesse a casa. E o Del - o gerente - tratou de me arranjar quem me trouxesse a casa em segurança. Vim com o Prof. Pardal! Eu explico... Ontem reparei que estava alguém a projectar qualquer coisa, em pé e a falar, na sala fechada que temos lá no MT. A meio da manhã esse orador veio comer qualquer coisa e houve alguém que se dirigiu à pessoa com um «então, senhor professor...». Como a pessoa em questão é pacata e tem um rosto miudinho, resolvi apelidar de Prof. Pardal! Até porque o programa de gestão das mesas tem a possibilidade de atribuir nomes às mesas para ser mais fácil saber quem paga o quê. Na altura os gerentes viram e acharam piada ao nome. Já foi adoptado por muitos. E a pessoa em questão soube na altura, o que me fez corar até às orelhas! Mas acho que também achou piada.

Assim que cheguei a casa fui direitinha tomar um banho! (dito à boca cheia) Pouco depois jantámos e ainda deu para estar ao computador um pouco antes de ir para a cama.

Na cozinha, de vez em quando, cheira a bacalhau. Comprámos uma quantidade um pouco maior que o normal de bacalhau seco quando o apanhámos em promoção. Está já guardado para o Natal já que, nessa altura, o preço dispara em flecha! Já só falta a família, os fritos, os doces, o perú, as árvores de Natal, os enfeites, as músicas, os presentes, o espírito da coisa... mas já não falta tudo!

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